No início de tudo, quando terra, céu e mar
ainda se confundiam em meio ao caos inicial, três deusas foram criadas a partir
das rochas cinzentas. A elas foi destinada a tarefa de cuidar daquilo que viria
a se chamar “tempo” e para que não houvessem disputas, dividiram-no em três
partes iguais: passado, presente e futuro.
Como foram talhadas em pedra, essas lindas
deusas nasceram frias, ásperas e cruéis, de forma que passavam os dias
brincando com o tempo da Terra sem nenhuma piedade. Divertiam-se sobretudo
dançando com as linhas que amarravam cada uma das três partes do tempo aos seus
tornozelos. Quando faziam isso, passado, presente e futuro se misturavam,
formando nós, desenhos e bordados, mostrando que no fundo, podiam ser uma coisa
só.
No entanto, a cada vez que moviam a roda do
tempo por meio das linhas em seus pequenos e ásperos tornozelos, notavam que rachaduras
surgiam em seus rostos. No começo eram finas, quase imperceptíveis, mas aos
poucos tornavam-se mais grosseiras, como erosões em suas belas faces de pedra.
Vaidosas, a função sagrada de fazer correr as eras, passou a amedronta-las. Ao se
perceberem envelhecidas e com os corpos cobertos de marcas, as três deusas
quase desistiram de seu lugar divino, preferindo talvez fundir-se novamente às
rochas que as pariram.
Foi quando descobriram na Terra a existência de
criaturas de aparência semelhante à dos deuses, mas que em sabedoria e
comportamento igualavam-se aos animais. Perceberam, naquele momento, que podiam
manter seus belos rostos intactos, desde que ao correr de cada dia sugassem um
pouco da vida daqueles animais tão semelhantes e, ainda assim, tão distintos
delas. Desde então, as três deusas do tempo ganharam juventude eterna, enquanto
os míseros homens passaram a definhar dia após dia, até a morte.